“Os apaixonados ainda escrevem cartas”. Li num pacote de açúcar num dos meus chás matinais. Fiquei estática a olhar para ele. Mexia comigo mais do que aqueles textos bonitos e recheados de melodias românticas que por aí andam a saltar de página em página. Colei o pacote na parede do quarto. Dia após dia olhava para ele e questionava:“será que ainda escrevem?”.
As novas tecnologias encurtam agora distâncias numa questão de segundos. Basta um simples “click” e ali estão os modernos apaixonados a trocar mensagens lamechas em plena rede social. Como se o amor fosse uma montra de moda, onde todos seguem a tendência, sem questionar. O amor virou aparência e a partir dele vieram os amantes modernos. Trocam mensagens de texto e tiram selfies para partilhar no Facebook ou Instagram. O amor já não é capaz de viver em casulos isolados. Ao contrário disso, passou a ser partilhado e comentado por todos.
Estar apaixonado não é gostar tanto de alguém que o coração bate a mil à hora? Amor não é querer essa pessoa como o maior presente do mundo? Não é ir até ao fim do mundo para estar com ela? A verdade é que as tecnologias passaram a ser a solução mais fácil e cómoda.
Será que ainda sabemos escrever cartas para aquela pessoa que nos faz sentir borboletas na barriga? Seremos ainda capazes de expressar esse sentimento imenso com a nossa própria letra, de alma grande e partilhar apenas com quem nos invade o pensamento todos os dias? O que se verifica é uma panóplia de aparências que vão sair da moda, porque um dia perderão a piada. Vivemos de amores enfeitados por aquilo que ainda ninguém conseguiu definir.
O pacote de açúcar permanece na parede do meu quarto. E todos os dias me provoca. Os apaixonados ainda escrevem cartas, mas são cartas diferentes. Já não as podem guardar numa gaveta e mais tarde reencontrá-la com a cor da letra fugida pela passagem do tempo e dizerem num tom nostálgico: “esta pessoa faz parte da minha história”.
E se a carta já não for do nosso apaixonado, então surgirão recordações de uma doce paixão que apareceu e que se foi, mesmo que nos tenham partido o coração em mil pedaços. E que importa? Temos ali a letra aos nossos olhos, as palavras fugidas e sinceras, porque não há nada mais bonito que escrever pelas nossas próprias mãos. Não há nada mais genuíno que a simplicidade da recordação.
O mundo rápido e louco transformou os sentimentos em passagens rápidas e robóticas. Amor agora é conforto e não luta. É egoísmo e não bondade. O amor passou a ser comparado a uma peça de roupa: depois de perder a graça é trocada por outra. E o amor que escreve cartas, poesia e canções vai-se embora do mundo que não consegue entrar.
Na verdade, só os corajosos é que ainda escrevem cartas de amor. Só eles têm a coragem mágica de sair da zona de conforto e expressar tudo o que lhes vai na alma. Partilhar um sentimento tão intenso é tudo menos fácil.
Caros apaixonados, não tenham medo de ser corajosos e loucos. Escrevam cartas. Esqueçam a moda. Rasguem a ousadia e declarem-se numa simples folha de papel. Podem até perder uma hora na fila dos correios e a carta até poderá só chegar no dia seguinte, mas o vosso apaixonado vai tocar na folha que também tocaram e sentir a vossa letra no papel.
E haverá maior beleza do que essa? O esforço, o genuíno, o apaixonante. Não tenham dúvidas: as cartas vão ser guardadas para sempre, nos sítios mais escondidos para desesperadamente serem esquecidas e mais tarde recordadas.
Os corajosos ainda escrevem cartas, porque acreditam que o amor sincero e altruísta ainda é possível. Que o amor difícil é o mais forte de todos. E porque isto de gostar de alguém causa vertigens. É difícil de controlar e expressar. Não é nada fácil. É uma tempestade sem fim. Mas é tão bonito quando vivido. Acreditem. O amor que escreve cartas é tão raro. Mas ainda existe. E posso garantir: é inesquecível.
«Quantas Sophies pensas que existem no mundo? Não esperes cinquenta anos para descobrir!»
In Letters to Juliet
~ Mil Cartas e Um Chá ~