A história que escrevo é sobre uma miúda, miúda do norte, conheci-a há uns três anos atrás, jovem, parecia-me simpática, simples e lutadora. Chegava de Madrid, onde havia terminado um estágio na área da comunicação visual e do design. Acabara de se licenciar. Procurava, agora, a sua oportunidade no mercado de trabalho, ora por Portugal ora por Espanha (seria uma alternativa). A vontade de trabalhar era muita, de cv em cv, de email em email, chegava uma entrevista que, embora sem o resultado pretendido, foi motivo para dar um novo passo. Um passo que a levava a viver em Lisboa. Havia juntado todas as suas economias (poucas, mas suas) e mudara-se para lá por um mês, na perspectiva de que se prolonga-se. O objectivo era simples, difícil, mas simples – conseguir um emprego ou a porra de um estágio profissional que fosse (em Portugal, parece ser o percurso normal).
Abril ia a meio, o objectivo parecia perder-se, convencia-se, assim, que Maio seria o mês do regresso a casa dos pais. Apenas a esperança não se perdia, ainda. O telemóvel toca, era uma entrevista. Começava então trabalho por 3 meses, que se estenderam por 5 meses. Estava contente. Estava em Lisboa. Estava a trabalhar. O objectivo estava alcançado. Entretanto, os 5 meses haviam passado, e a procura por um novo trabalho tornara-se agora mais fácil. Conhecia as setes colinas, conhecia amigos, pessoas novas. Apaixonava-se. Tudo parecia, finalmente, estar encaminhado.
De repente, e sem perceber porquê, o seu o coração palpitava a um ritmo invulgarmente acelerado. Até que um dia, no final de um dia já no seu novo emprego, o seu coração teimou em acelarar de novo e o inesperado acontece. Ela perdeu os sentidos. Desmaiou. Caiu, em pleno dia, quando o sinal vermelho da passadeira a fez parar. Cinco pontos e uns dias de repouso, entre curativos e exames, na busca da resposta ao que havia acontecido. “Deve ser stress e pouco descanso, menina!” diziam-lhe. Certa de que aqueles dias antecedentes eram atípicos, a procura de emprego e uns quantos trabalhitos, mas seria stress mesmo?
Ela sempre foi saudável. Recorda-se de em pequena ir ao médico e “queixar-se” sempre da mesma coisa, “não me dói nada, tenho é má circulação só” ao que o médico lhe dizia não haver nada a fazer. Mas a resposta ao desmaio e ao dito coração “acelerado” demorou aí duas semanas. Uma dor na perna, um edema, levava-a a ser internada com o diagnóstico grave – T.V.P, uma trombose venosa profunda. Estas três palavras ecoaram em lágrimas, que durante alguns minutos e por muito forte que fosse, tornaram-se inevitáveis. As perguntas dos médicos misturavam-se com o turbilhão de sentimentos. Entre exames e estudos o resultado era agora conhecido, a pílula. Sim a pílula que o médico, a quem ela se queixava da má circulação sanguínea, tantas vezes a “incentivou” a tomar e que ela adiou por uns anos, mas que agora havia iniciado há 2 meses. Como podia saber ela que pessoas com má circulação não podem tomar a pílula, se inclusivé era aconselhada em todas as consultas com o seu médico de família?
E era isso que a revoltava, não era o facto de estar internada, não era o facto de estar sozinha em Lisboa, não era o facto de perder o emprego que mal havia começado, era a maldita pílula. Ela é que a fazia estar ali. Era ela que pouco a pouco mudava a sua vida. Era ela que arrastava novos cuidados e uma nova rotina. Era ela que a afastava de Lisboa. O mundo estava ao contrário. Em jeito de conforto (pouco), um médico disse-lhe que não sabia onde ele estava, mas que certamente tinha um anjo que a protegeu de algo ainda mais grave, porque a trombose que tinha era uma “senhora trombose”. Mas, e modéstia à parte, são poucas as pessoas que conheço guerreiras, descomprometidas e positivas, e sempre, sempre bem dispostas. E isso, o dia 21 de Outubro de 2013 não lhe roubou. Com 22 anos, essa miúda era eu.
Infelizmente não sou caso único. Infelizmente tenho amigas que passaram pelo mesmo. Infelizmente conheço histórias sem o final “feliz”. Por isso, para as mulheres, para as jovens mulheres informem-se. Acautelem-se. Questionem. Ponderem. Revoltem-se. Chorem. Sorriam. Sorriam sempre. E nunca desistam do que vos faz felizes.

~ muitos chás e mil sorrisos ~
p.s.: E aos médicos, enfermeiros e auxiliares que sempre foram prestáveis e simpáticos, a todos eles um obrigado.
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